Cem mil americanos disseram adeus a Reagan
"É incrível o que tenho visto na televisão", disse Nancy Reagan ao comentar as imagens das 100 mil pessoas que se foram despedir do defunto Presidente norte-americano. "As manifestações de amor são incríveis". Na terça-feira, o corpo de Ronald Reagan, falecido no sábado passado, esteve na Biblioteca Presidencial Ronald Reagan, na Califórnia.
Ontem, foi transferido para o Capitólio, onde ficará até ao funeral de estado, que se realiza amanhã de manhã, esperando-se a presença de 200 mil pessoas . Está prevista uma cerimónia fúnebre na Catedral Nacional, assistida por 20 chefes de Estado, e com discursos do ex-Presidente norte-americano George Bush (que foi "número dois" da Administração Reagan), da ex-primeira-ministra britânica Margaret Thatcher e do actual Presidente dos EUA, George W. Bush, entre outros.
O chefe da polícia de Capitol Hill, Terrance Gainer, afirmou ontem que esta a ocasião poderá ser um alvo "muito atraente" para terroristas, mas adiantou que não existe nenhuma informação dos serviços secretos que aponte para esse risco. De qualquer forma, foram mobilizados para amanhã entre três mil e quatro mil forças de segurança.
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A morte do ex-presidente Ronald Reagen criou uma onda de nostalgia na América, que honrará a sua memória sexta-feira com um funeral de Estado, incluindo rituais de verdadeiro herói.
Em Washington, onde decorrerão as cerimónias oficiais, as autoridades procedem a preparativos acelerados para receber uma "invasão" de dignitários estrangeiros e nacionais, enquanto o país é invadido por uma intensa cobertura da vida daquele que foi um dos presidentes mais populares dos Estados Unidos.
Quando terminou o seu segundo e último mandato, em Dezembro de 1988, 57 por cento por cento do eleitorado norte-americano considerava- o um excelente presidente. Hoje, são mais de 70 por cento os que pensam assim.
Essa onda de popularidade, à mistura com a nostalgia gerada pela morte sábado passado de Reagan, reflecte-se nomeadamente na cobertura televisiva que está a ser dada, em que os erros e insuficiências do ex-presidente são praticamente ignorados em favor da jovialidade, humor, bons modos e êxitos.
Mesmo os mais duros críticos de Reagan concordam que o ex- presidente - considerado inicialmente por muitos como um "cowboy" ignorante - deixou a sua marca na história norte-americana e que pode, juntamente com Franklin Roosevelt, ser considerado o mais importante Presidente americano do Século XX.
Na capital federal, o seu impacto é evidente: um dos maiores edifícios governamentais de Washington tem o nome de Ronald Reagan, à semelhança de várias salas de edifícios governamentais, além de um aeroporto - o Aeroporto Nacional Ronald Reagan.
No Pentágono, afinam-se os pormenores do sistema de defesa anti-míssil, herdeiro do famigerado plano "Guerra das Estrelas" que tanta controvérsia causou e que foi mesmo considerado irrealizável.
A herança de Reagen é ainda visível quando se fala de algumas personalidades da vida do país.
A primeira mulher a ser nomeada como juiz do Supremo Tribunal, Sandra Day O+Connor, continua em funções e, no Departamento de Estado, recorda-se que foi Reagan quem nomeou Colin Powell para seu conselheiro de Segurança Nacional em 1987, lançando a carreira política do então general. Powell foi o primeiro cidadão negro norte- americano a ocupar tal posto.
Ronald Reagan mudou drasticamente o cenário político norte- americano, dando impulso ao conservadorismo que acabou com o domínio do Partido Democrata no Congresso.
Hoje, no seio do Partido Republicano, são muitos os políticos que tentam a todo o custo ser apelidados de "Reagan Republicans", frase que geralmente significa uma política de valores sociais conservadores, impostos baixos e redução do papel do governo central nos Estados que formam o país e também na vida diária dos norte- americanos.
O seu impacto na política interna foi tal que muitos republicanos recordam com saudade que foi durante os mandatos do ex- presidente que surgiu o fenómeno dos "Reagan Democrats", ou membros do Partido Democrata que apoiavam abertamente Reagan.
Ronald Reagan foi também o primeiro Presidente republicano a procurar e conseguir transformar numa força política de grande impacto as igrejas cristãs Evangelistas, o que resultou no surgimento e crescimento da "direita religiosa" que hoje tem uma enorme influência na política interna, e mesmo externa, norte-americana.
Em termos económicos, Reagan mudou os parâmetros da discussão sobre os impostos. Hoje debate-se não se os impostos devem ser reduzidos, mas sim até que ponto podem ser reduzidos.
Reagan foi também o primeiro Presidente a dominar totalmente e com mestria a televisão enquanto veículo político, fazendo uso do seu inimitável à vontade e conforto frente às câmaras, algo aprendido como actor em Hollywood.
Daí a sua alcunha de "o grande comunicador", que, de acordo com alguns analistas, marca uma viragem na política presidencial norte- americana, com a imagem a sobrepor-se à substância.
Na política externa, debate-se o papel dos governos de Reagan na queda do comunismo na Europa e a sua agressividade em combater com movimentos de guerrilha (até então um monopólio das forças revolucionárias) governos pró-soviéticos na Nicarágua, Angola e Afeganistão.
O uso de um vocabulário simples, baseado na cultura popular de filmes de Hollywood, confirmou para muitos críticos a sua ausência de ideias e o perigo de uma política externa baseada em slogans, mas teve um impacto que ainda hoje é patente. Ronald Reagan descreveu a União Soviética como "o império do mal". Hoje George Bush fala do "eixo do mal".
O que mais popularizou o ex-presidente foi, no entanto, a sua aura de optimismo "tão brilhante, que parecia quase uma força da natureza", como escreveu o New York Times em editorial.
Quando venceu as primeiras eleições em 1980, o país encontrava- se desmoralizado pela derrota no Vietname, o escândalo Watergate e uma crise económica, em que a elevada inflação parecia não ter solução.
Reagan lembrou aos norte-americanos a "grandeza" da América e a sua capacidade em ultrapassar obstáculos, conseguindo ser numa só pessoa "o passado ideal, a esperança do presente e o êxito do futuro", disse o historiador Gary Wills.
Para um outro historiador, Robert Dalleck, Reagan recuperou a imaginação dos norte-americanos porque "conseguiu reacender a esperança no país e restabelecer um espírito positivo,".
Em editorial, o Los Angeles Times não discorda mas lembra que Reagen, ao mostrar "uma cara feliz, mesmo face às realidades mais horríveis", usou muitas vezes "histórias e estatísticas duvidosas" e ignorou "factos desagradáveis, idealizando fantasias de esperanças".
O historiador Mark Hertagasrd concorda, afirmando que ninguém quer falar agora da "incapacidade ou falta de vontade de Reagan de distinguir entre factos e ficção".
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