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Thursday, July 15, 2004

"Eternal Sunshine of the Spotless Mind"




Sobre o "Eternal Sunshine of the Spotless Mind" o Tiago escreveu isto: «é um filme sobre relações que nunca irão resultar e pessoas opostas que insistem em abraçar-se porque um momento de carinho é também um minuto de felicidade. O guião de Charlie Kaufman é precioso, humano e invulgar (só em Portugal é que não se reconhece que o escritor é uma voz única no cinema americano, mais, é o primeiro guionista a assumir a condição de 'estrela' sem nunca se sentar na cadeira de realizador), as interpretações equilibradas, a direcção de Michael Gondry adquada e inovadora. Este é um dos filmes mais comoventes e menos sentimentais do ano. A relação entre Jim Carrey e Kate Winslet é tão comum que não há ninguém (excluindo os críticos de cinema, claro) que não se identifique com ela. Todos sofremos e, por vezes, o esquecimento parece ser a melhor solução. Mas isso seria ignorar quem fomos e em quem é que nos tornámos. E, como estava escrito numa caneca que ofereci a uma ex-namorada, "when we look back, we don't remember days, we remember moments". Para a maioria dos críticos portugueses, nada disto importa. "Eternal Sunshine of the Spotless Mind" foi tratado como outra qualquer comédia romântica. Na minha opinião, e este texto é apenas e só a minha opinião, talvez lhes falte emoção. Melhor ainda, talvez lhes falte tesão. Ou, como disse um amigo, talvez lhes falte simplesmente vida».

Ele falou e eu fui ver. Porque ele tem razão. Porque é um dos filmes «mais comoventes e mais simples e mais complexo» que eu já vi.
Porque, de facto, só uma pessoa sem vida não se identifica num ou noutro momento com a relação de Kate Winslet e Jim Carrey.

O filme tirou-me uma dúvida: podemos nós esquecer? Fazer delete? Formatar? Podemos. A verdade é que podemos, mas não adianta. Os fragmentos que apagamos ficam no recicle byn do cérebro e ocupam muito espaço. Quando menos se espera, esses fragmentos soltos voltam, normalmente para fazer atrasar o sistema.

O melhor é não apagar memórias, ensina-nos Kaufman. O melhor é saber lidar com elas de forma a que elas não nos atormetem e não regressem em forma de uma má memória. Mas simplesmente de um acontecimento que deixou de ter vida própria.

"Eternal Sunshine of the Spotless Mind" é um dos filmes mais bonitos que eu já vi. A pele fica arrepiada desde o segundo minuto. Com a imagem daqueles dois num cérebro onde tudo pode acontecer. Com a imagem de duas pessoas que tentam apagar o amor e não conseguem. Porque não há um botão, porque ao clicar num dispositivo deixamos marcas daquele delete. Porque o cérebro permite o delete. Mas o coração, não. O coração aprende a viver com a memória que se quer apagar. Até que um dia... essa memória fica. E fica bem. Sem incómodo. Sem passado. Sem densidade. Existe, convive, relaciona-se com outras memórias. E não passa disso: de uma memória. Explicar isto em filme não tinha sido possível até "Eternal Sunshine of the Spotless Mind" ter chegado aos cinemas. Agora é. Possível.

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